Infecção Fúngica Deixa Pacientes Cegos Após Mutirão de Cirurgia de Catarata
- Priscila Gabriella Carraro Merlos
- 3 de nov. de 2023
- 5 min de leitura
Possíveis Motivos e Medidas para Prevenção de Infecções em Cirurgia
Uma tragédia ocorreu após um mutirão de cirurgia de catarata, onde 141 pacientes foram submetidos ao procedimento. No entanto, após a cirurgia, 104 pacientes começaram a se queixar de sintomas alarmantes, incluindo dor, inflamação e perda de visão. O diagnóstico apontou para uma infecção aguda no globo ocular causada por um fungo conhecido como Fusarium. Destes pacientes, 55 precisaram de uma segunda cirurgia na tentativa de reverter a infecção, enquanto outros 14 foram submetidos a transplantes de córnea. Lamentavelmente, sete pacientes perderam a visão em um dos olhos definitivamente. O mutirão ocorreu entre os dias 4 e 8 de setembro de 2023, com um total de 540 pacientes operados. Surpreendentemente, a infecção afetou os pacientes operados especificamente no dia 4.
Várias razões podem ter contribuído para essa a ocorrência desta tragédia e aqui estão alguns possíveis motivos:
Contaminação no Ambiente Cirúrgico: A sala de cirurgia pode ter sido contaminada com o fungo Fusarium. Isso poderia ter ocorrido devido a uma falta de esterilização adequada dos instrumentos cirúrgicos, superfícies ou do próprio ambiente. Mesmo pequenas quantidades de fungos no ambiente podem se tornar um problema durante procedimentos cirúrgicos, especialmente nos olhos, onde qualquer infecção pode ser crítica.
Água Utilizada na Cirurgia: O uso de água não esterilizada ou inadequadamente tratada durante a cirurgia ocular é um possível ponto de origem da contaminação. A água é uma fonte comum de esporos de fungos, incluindo Fusarium. Se a água usada para irrigar o olho ou para limpar os instrumentos cirúrgicos não foi devidamente tratada, ela poderia introduzir o fungo no globo ocular dos pacientes.
Falta de Higiene Pessoal: A má higiene pessoal dos profissionais cirúrgicos é um possível fator. Se os médicos, enfermeiros e outros membros da equipe cirúrgica não seguiram procedimentos rigorosos de higiene, eles poderiam ter introduzido o fungo durante a cirurgia.
Procedimentos Cirúrgicos em Série: O fato de um grande número de cirurgias terem sido realizadas em um curto período de tempo pode ter contribuído. Durante mutirões cirúrgicos, pode haver pressão para realizar procedimentos em série, o que às vezes leva a atalhos ou a uma menor atenção aos protocolos de esterilização.
Baixa Conscientização sobre Infecções Fúngicas Oculares: Os profissionais de saúde podem não ter sido adequadamente treinados para reconhecer os sintomas de infecções fúngicas oculares e responder apropriadamente. Isso pode ter atrasado o diagnóstico e tratamento dos pacientes.
Material Cirúrgico Contaminado: Os instrumentos cirúrgicos ou os materiais usados durante a cirurgia podem ter sido contaminados com Fusarium. Isso pode ocorrer se os instrumentos não forem devidamente esterilizados ou se houver contaminação durante o armazenamento.
Falta de Fiscalização e Controle de Qualidade: A falta de fiscalização e controle de qualidade adequados durante o mutirão cirúrgico é um problema. Os órgãos reguladores de saúde devem garantir que todas as instalações cirúrgicas sigam padrões rigorosos de higiene e esterilização.
Atraso no Diagnóstico: O diagnóstico tardio da infecção fúngica é uma preocupação. Se os pacientes não foram monitorados de perto após a cirurgia e os primeiros sinais de infecção foram negligenciados, isso poderia ter permitido que a infecção se agravasse.
Surtos Anteriores Desconhecidos: Pode haver um histórico de surtos de infecções fúngicas que não foram devidamente documentados. Isso significa que o problema já existia, mas não havia sido identificado.
É importante que uma investigação completa seja conduzida para determinar a causa raiz da contaminação e da subsequente infecção. Isso envolverá uma análise detalhada dos protocolos cirúrgicos, das condições de esterilização e da conduta dos profissionais de saúde envolvidos. Além disso, é fundamental que medidas preventivas sejam implementadas para evitar futuros incidentes.
Para evitar e prevenir contaminações como a mencionada após um mutirão de cirurgia, é fundamental adotar medidas rigorosas de controle de infecção e segurança do paciente. Aqui estão algumas condutas que podem ser tomadas para evitar esses problemas:
Rigorosa Esterilização e Desinfecção:
Garanta que todos os instrumentos cirúrgicos sejam esterilizados adequadamente antes de cada cirurgia.
Utilize equipamento de esterilização de alta qualidade e siga as diretrizes e os protocolos recomendados.
Realize verificações regulares para garantir que os procedimentos de esterilização estejam sendo seguidos.
Higiene Pessoal e Vestimenta:
Exija que todos os profissionais de saúde envolvidos na cirurgia adotem rígidos protocolos de higiene pessoal, incluindo lavagem das mãos e uso de roupas cirúrgicas limpas.
Evite o uso de acessórios, como anéis e relógios, que possam reter microrganismos.
Uso de Água Estéril:
Certifique-se de que a água utilizada durante a cirurgia seja completamente estéril e tratada para eliminar qualquer contaminação por microrganismos, incluindo fungos.
Treinamento e Conscientização:
Forneça treinamento regular aos profissionais de saúde sobre as práticas mais recentes de controle de infecção e os sintomas de infecções oculares, incluindo infecções fúngicas.
Certifique-se de que a equipe esteja ciente dos riscos associados à falta de esterilização e à higiene inadequada.
Fiscalização e Auditoria:
Implemente programas regulares de auditoria e fiscalização para verificar o cumprimento dos protocolos de segurança e higiene em ambientes cirúrgicos.
Seja pró-ativo na identificação e correção de quaisquer problemas antes que se tornem uma ameaça à segurança do paciente.
Controle de Qualidade:
Mantenha um rigoroso controle de qualidade em relação aos materiais utilizados durante as cirurgias e ao armazenamento dos instrumentos cirúrgicos.
Verifique regularmente o estado de conservação dos equipamentos.
Monitoramento Pós-Operatório:
Estabeleça um sistema de monitoramento pós-operatório que permita o acompanhamento próximo dos pacientes após a cirurgia.
Treine a equipe para identificar precocemente sinais de infecção ou complicações.
Divulgação de Informações:
Promova a conscientização entre os pacientes sobre os riscos e complicações potenciais de cirurgias oculares, incluindo infecções fúngicas.
Forneça informações claras sobre os sintomas que os pacientes devem observar após a cirurgia.
Comunicação Eficaz:
Estabeleça uma comunicação eficaz entre todos os membros da equipe cirúrgica e outros profissionais de saúde envolvidos na cirurgia.
Encoraje relatórios de incidentes e preste atenção a qualquer preocupação levantada por membros da equipe.
Foco na Qualidade, Não na Quantidade:
Evite pressões para realizar cirurgias em grande número em um curto período de tempo, como em mutirões.
Priorize a qualidade e a segurança do paciente em vez da quantidade de procedimentos realizados.
Essas condutas são essenciais para prevenir infecções em ambientes cirúrgicos. É importante que hospitais, clínicas e equipes cirúrgicas adotem uma cultura de segurança do paciente e estejam comprometidos em seguir as melhores práticas de controle de infecção e esterilização em todos os momentos.
O fungo Fusarium
O Fusarium é um gênero de fungos filamentoso e unicelular que abriga uma grande variedade de espécies, algumas das quais são importantes na agricultura, patologia humana e de animais, além de serem fundamentais para a ciência e a indústria.
Caracterizados por sua estrutura multicelular com hifas e pela produção de esporos assexuais chamados conídios, os fungos Fusarium exibem uma ampla diversidade de espécies, com características morfológicas e capacidades metabólicas variadas.
Em relação à agricultura, algumas espécies de Fusarium são patógenos de plantas, causando doenças em várias culturas. Além disso, algumas podem produzir micotoxinas, substâncias tóxicas que podem contaminar alimentos e rações.
Não se restringindo à agricultura, esses fungos também são patógenos oportunistas em seres humanos e animais, com capacidade de causar infecções em órgãos como a pele, unhas, pulmões e olhos, particularmente em pessoas com sistemas imunológicos enfraquecidos.
A produção de micotoxinas, como tricotecenos e zearalenona, por alguns Fusarium, pode impactar negativamente a saúde, causando distúrbios gastrointestinais, imunossupressão e outros problemas.
Apesar desses aspectos negativos, alguns Fusarium têm aplicações industriais benéficas, como na produção de um substituto de carne conhecido como Quorn. Além disso, esses fungos são usados em pesquisas científicas, incluindo estudos sobre genética de fungos e produção de enzimas e metabólitos secundários de interesse.
Por serem onipresentes no ambiente, encontrados em solos, plantas, água e materiais orgânicos em decomposição, o controle de Fusarium é um desafio, especialmente em contextos agrícolas. Portanto, compreender suas características e capacidades é fundamental para mitigar seus efeitos prejudiciais e aproveitar seu potencial benéfico em aplicações industriais e científicas.
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